07/01/2017

Mário Soares 1924-2017

«- Para terminar, permita que lhe faça uma pergunta de ordem pessoal. O Dr. Mário Soares é conhecido, desde estudante, como oposicionista. Nunca ocultou as suas ideias e isso tem-lhe acarretado alguns dissabores. Antes de deportado esteve preso várias vezes. Essa experiência dolorosa não lhe trouxe ressentimento, uma certa amargura à vida? Por outras palavras: acha que valeu a pena?

- Sem sombra de dúvida! O problema, de resto, nunca se me pôs nesses termos. A minha actuação política oposicionista, que se vem exercendo há cerca de vinte e cinco anos - sempre na legalidade, embora sujeita às vicissitudes conhecidas! -  resultou de imperativos morais ou, se quiser, de consciência. Sendo psicologicamente como sou, não poderia ter agido de outra forma. As prisões e a deportação considero-as como uma espécie de acidentes de viação. Foram muito desagradáveis, claramente, mas passaram sem deixar marcas visíveis. Aliás devo dizer, em abono da verdade, que foram muito menos graves do que os que sofreram - e sofrem! - tantos outros portugueses, altos exemplos cívicos, pelo desinteresse pessoal, pelo idealismo, pelo espírito de patriótica abnegação! Quanto a ressentimento, não sinto nenhum - em relação a ninguém. Para mim, o que conta é o presente e, principalmente, o futuro. O passado só interessa como matéria de experiência humana e de reflexão. Ora, nesse aspecto, o que lhe posso dizer é que a minha vida não tem sido monótona. Não me sinto, pois, com razões especiais de queixa em relação à vida - antes pelo contrário!»

in "Escritos Políticos", 1969
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