Muito se disse e se escreveu sobre estas eleições europeias (2014) e sobre as eventuais consequências dos resultados, tanto ao nível nacional como ao nível europeu.
Um dia depois do sufrágio ainda não são conhecidos os resultados finais:
«Com os resultados de inscritos e votantes já disponíveis (7965 inscritos e 481 votantes) dos consulados que têm suspenso o apuramento por estarem a aguardar, para apuramento, os votos de mesas com menos de 100 eleitores, é possível concluir pela certeza da distribuição dos quatro mandatos ainda não atribuídos na plataforma às candidaturas da Aliança Portugal, CDU - Coligação Democrática Unitária, Partido da Terra e Partido Socialista (indicados por ordem alfabética, por não ser definitiva ordem da sua atribuição).»
Há já quem o tenha feito e, diga-se, com alguma lógica e sentido, mas há alguns indicadores nestas eleições (ainda que, à data de hoje, os dados sejam provisórios) que lançam para a discussão algumas pistas sobre quem mais perdeu e quem mais ganhou. A interpretação, fica ao critério de cada um:
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Dados comparativos (provisórios à data 26.05.2014) |
Evidências que saltam à vista de 2009 para 2014: o PS apenas aumentou o seu leque de votantes em 86.407 votos; PSD e CDS juntos perderam 517.869 votos; CDU só aumentou em 36.323 votos o seu anterior resultado; MPT conquista mais 211.104 votos e o BE perdeu 232.445 votos. Menos 279.146 eleitores inscritos deixaram de ir votar, aumentando o número de abstencionistas, e dos votantes, 29.325 decidiram ir às urnas anular o seu voto.
Parece-me, portanto que, nem a CDU foi o grande agregador do voto de descontentamento do eleitorado, nem o PS teve um grande crescimento face a 2009. BE é, de facto, um grande perdedor ao lado do PSD e CDS. O MPT, sim, com um discurso também ele pouco virado para a Europa, talvez tenha sido aquele que melhor conseguiu capitalizar o voto de descontentamento. (Julgo ainda que um partido uni-pessoal como é o Livre, com 71.558 votos, teve um muito bom resultado.)
Há, ainda um outro dado importante que não foi referido, ou pelo menos não encontrei qualquer referência na comunicação social ou na comunicação dos partidos (e que o PS poderá ou poderia ter capitalizado mas não o fez, optando por se focar numa subida de (quase) 5 pontos percentuais): tendo havido uma redução do número de deputados portugueses no PE, de 22 para 21, é muito provável que o maior prejudicado (utilizando os resultados provisórios à data de hoje) tenha mesmo sido o PS - se se mantivessem os 22 eurodeputados, muito provavelmente o PS elegeria o 9 eurodeputado alargando a distância em relação à coligação PSD/CDS:
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Distribuição de eurodeputados pelo Método d'Hondt (resultados provisórios à data 26.05) |
Com estes dados, facilmente se conseguirá compreender os motivos de preocupação de António Costa ou as conclusões de Nuno Severiano Teixera, hoje (26.05), no Público: "[...] derrota clara da coligação que é a punição do Governo e da política de austeridade, sem dar uma vitória folgada ao Partido Socialista."
Mas o que fica claro é que num sufrágio que tinha como objectivo a eleição de deputados para o Parlamento Europeu, a campanha foi quase exclusivamente focada nas questões internas do país.
Os partidos, note-se, nenhum foi capaz de explicar aos eleitores a importância destas eleições de 25 de Maio. Tanto a importância que o Parlamento Europeu desempenha no dia-a-dia dos cidadão europeus, assim como o significado da alteração que o Tratado de Lisboa introduziu na escolha do Presidente da Comissão Europeia - é que mesmo que continuem a ser os Governos (Conselho Europeu) a decidir sobre o Presidente da Comissão, o resultado das eleições terá impacto nessa escolha uma vez que tem de ser tomado em consideração no nome a propor. E por isso, as consequências estão à vista: uma enorme abstenção (66,10% em Portugal, a cima da média europeia 56,91%) e um claro crescimento das forças anti-europeias e radicais (à esquerda e à direita!) na Europa. Mas foi este um problema unicamente português? Não, não foi.
A perspectiva sobre o futuro da Europa está nublada. Mas a do sistema partidário português não augura nada de bom... é que, como escreveu um dia Peter Mair (em Ruling the Void):
«The age of party democracy has passed. Although the parties themselves remain, they have become so disconnected from the wider society, and pursue a form of competition that is so lacking in meaning, that they no longer seem capable of sustaining democracy in its present form.»