21/02/2010

Alguém vai ter que se retratar

Paulo Rangel disse:



«Da forma que estamos a andar, Portugal já não é um Estado de direito, é um Estado de direito formal onde o Primeiro-Ministro se limita a formalidades, a procedimentos e formalismos e não quer dar explicações substanciais.»



Pinto Monteiro (Procurador Geral da República) escreveu:

«Não encontrei, nem nenhum dos magistrados que comigo colaboraram encontraram indicios que apontem para o cometimento do crime de atentado ao Estado de Direito, que não foi certamente previsto para casos como este.

[...]

Eventuais propostas, sugestões, conversações sobre negociações que, hipoteticamente, tenham existido no caso em apreciação, não têm idoineidade para subverter o Estado de Direito. Poderão ter várias leituras nos planos político, social ou outros, mas isso não corresponde, necessariamente, à constituição de crime.

[...]

Escutas essas julgadas criminalmente irrelevantes.

[..]

... não existem quaisquer indícios juridicamente relevantes e válidos que apontem para a existência de um atentado ao Estado de Direito.

[...]

... a divulgação total e completa das escutas (e não partes ou arranjos), se fosse permitida - que não é - mostraria que não existem indicios de crime contra o Estado de Direito.

[...]

É também importante dizer que o chamado caso das escutas, no processo Face Oculta, é neste momento meramente político. Pretende-se conseguir determinados fins políticos utilizando para tal processos judiciários e instituições competentes.»


Parece-me que alguém quis "romper" e acabou borrar a pintura toda. Há alguém que se precisa de retratar!


Hesito...


2 comentários:

  1. Sem hesitar,
    Um abraço ao meu amigo Pedro,

    Subscrevo por inteiro as palavras de Paulo Rangel.
    Não tenho (nem consigo ter) a certeza absoluta do alcance que ele quis dar a elas, mas cá vai a minha leitura.
    Estado de direito (wikipedia):
    Estado: é uma instituição organizada política, social e juridicamente, ocupando um território definido, normalmente onde a lei máxima é uma Constituição escrita, e dirigida por um governo que possui soberania reconhecida tanto interna como externamente. Um Estado soberano é sintetizado pela máxima "Um governo, um povo, um território". O Estado é responsável pela organização e pelo controle social, pois detém, segundo Max Weber, o monopólio legítimo do uso da força (coerção, especialmente a legal).
    Estado de direito um sistema institucional, no qual cada um é submetido ao respeito do direito, do simples indivíduo até a potência pública. O Estado de direito é assim ligado ao respeito da hierarquia das normas, da separação dos poderes e dos direitos fundamentais. Em outras palavras, o Estado de Direito é aquele no qual os mandatários políticos (na democracia: os eleitos) são submissos às leis promulgadas. A teoria da separação dos poderes de Montesquieu, na qual se baseiam a maioria dos Estados ocidentais modernos, afirma a distinção dos três poderes (executivo, legislativo e judiciário) e suas limitações mútuas.
    Segundo os últimos resultados oficiais, dos 9.514.322 de votantes inscritos, 2.077.695 elegeram o PS como partido mais votado nas legislativas de 2009, pelo que, a contrario, 3.606.272 discordaram desta escolha. Restam, portanto, 3.830.355 de alminhas que “se estão bem marimbando” para o -repetido até à náusea - “dever cívico”. Só estes dados permitem vislumbrar o que passa nesse submundo que é a sociedade civil. É que lá, nesse mundo do povinho, o que verdadeiramente interessa é a sobrevivência de cada um e dos seus respectivos. E quem aparece, na caixinha mágica, a pedir votos para a eleição a um tacho pago com o dinheiro de cada um deles, não é nem melhor nem pior do que os que por lá passaram. E todos sabemos que não são poucos os que acreditam que o único sério que por lá andou foi o que lá esteve durante quase 50 anos e morreu pobre. É triste mas é verdade.
    (cont.)

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  2. (cont).
    Para todas essas pessoas, tão portuguesas como qualquer uma das que vota, deixou de fazer sentido participar na elogiada democracia representativa porque simplesmente eles não se sentem representados. E se algum deles votou, já se sente arrependido pois os piores exemplos vêm de cima. Eu poderia enunciar dezenas de exemplos de podridão dos nossos governantes mas basta o exemplo máximo daquele que foi eleito primeiro-ministro: “formalmente, eu não sabia do negócio PT/TVI”. Dá vontade de dizer: “informalmente, V.Ex.a é um mentiroso”. Sugiro que se faça uma sondagem nunca antes vista, com a participação de universidades, voluntários, empresas de sondagens no sentido de apurar a razão das abstenções e a imagem dos governantes perante os eleitores. Para mim, os resultados não seriam novidade.
    Meu caro Pedro. O Direito existe para servir o Homem. Nada de estranho nesta afirmação uma vez que se sabe que quem inventou o Direito foi o Homem. Já o mesmo não se passa com a Natureza e as ciências que lhe estão associadas: a física, a química, a biologia, as matemáticas, etc… Todas estas realidades científicas já cá andam desde o início dos tempos e nós, humanos, apenas nos limitamos a tropeçar nestas evidências cósmicas e volta não volta gritamos “eureka”.
    Regressando ao Direito. Pergunto-me: será que o Direito existe mesmo? Será que ao Direito não podíamos aplicar aquela questão filosófica da árvore que tomba num bosque e, não havendo ninguém por perto para ouvir, terá feito barulho ao cair? Por outras palavras: será que o Direito se impõe por si mesmo sem que haja quem o ouça? Melhor: será que existe Direito sem que o Homem o reconheça?
    Se um homem ameaçar outro de morte caso este não lhe pague uma dívida e, temendo o pior, o devedor ameaçado acaba por entregar o dinheiro, onde andou o Direito por aqui? Se de uma sentença judicial resultar a condenação de A a pagar a B € 15.000,00 mas A não pagar, onde anda o Direito se B não tiver dinheiro para intentar acção executiva, ou para pagar a advogado, ou para a pagar novas custas judiciais? Meu caro, não te deixes enganar: o Direito só se afirma na medida em que as pessoas o reconhecerem como válido. No dia em que as pessoas perceberem que o Direito só se aplica verdadeiramente a quem se submete voluntariamente a ele e que quem faz o Direito é incompetente e/ou manipulador das leis, então não há tribunal que vá conseguir impor o pagamento de um multa que seja.
    Portanto, restam-me poucas dúvidas que Portugal é cada vez mais um Estado de Direito formal. E só rompendo com este lodaçal se pode tentar entrever alguma luz no fundo deste túnel em que nos temos vindo a enfiar cada vez mais e mais.
    Só para lembrar que o Estado de Direito de Angola acabou de fazer uma revisão constitucional proibindo a candidatura a presidente da república de quem não venha proposto por um partido político. Mais: o Estado de Direito da Venezula tem andado a encerrar órgãos de comunicação social por, entre outras coisas, se recusarem a transmitir os iluminados discursos do Chefe. E tudo isto está na lei. Hitler subiu ao poder por via de eleições livres (e lá se manteve) em pleno Estado de Direito.
    Diziam os romanos que nem tudo o que é lícito, é honesto (“non omne quod licet honestum est”). Resta-nos, portanto, ficarmos contentes por saber que apesar de mentiroso e manipulador, o nosso primeiro-ministro não cometeu nenhum crime. Caso contrário…. Ui, ui, a coisa piava mais fininho. Sabe-se lá o que aconteceria.
    Ah … e não esquecer que quem chegou àquela imaculada conclusão foi o Sr. Procurador Geral da República, o mesmo que afirmou ser impossível erradicar os acidentes de viação em Portugal tal como é impossível erradicar a violência doméstica. Agora, sim. Dormirei mais descansado.

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