21/10/2011

As certezas do desconhecido

Não podemos ficar indiferentes aos recentes acontecimentos na Líbia. Seja em relação à chacina da população nas mãos dum ditador, seja em relação a todo o "processo" da captura e morte desse mesmo ditador, Muammar Gaddafi (que por cá chamámos Kaddafi).


Os actos de barbárie do ser humano, ainda que sejam fáceis de despoletar e com um rastilho muito curto, agravando-se quando inserido num grupo, não são, na minha perspectiva, normais. São parte do comportamento animal e consequentemente do comportamento humano, mas a sociedade, e sem entrar nas teorias de Hobbes e Lock, encarregou-se de considerar esse comportamento, que Freud considera uma predisposição inata, como inaceitável - ou pelo menos assim aconteceu numa enorme larga maioria de sociedades.


Mas pior do que as imagens divulgadas do corpo de Gaddafi arrastado pelas ruas nas mãos duma multidão eufórica, que agora se diz que afinal não foi morto em fogo cruzado na sequência dum ataque da NATO mas sim numa execução sumária, são as vozes de responsáveis políticos internacionais que já vieram à praça rejubilar com o sucedido.
Ainda que compreendamos que a queda dum déspota pode ser um ponto de partida para um novo período da história, a sua morte e o seu corpo não devem ser usados como bandeira da Liberdade! è que o futuro, ninguém o conhece.
Bem fez Barack Obama ao recusar divulgar imagens do corpo de Ossama Bin Laden. Se o mandatário do assassínio de milhares de pessoas efectivamente morreu no seguimento da tentativa de captura (e aqui poderíamos entrar noutra discussão que também seria interessante), o assunto fica encerrado e fim da história. Novo começo.


O mais perigoso é quando usamos este tipo de bandeiras para fazer "futurologia". Parece-me que o entusiasmo pela morte de alguém que deveria ser preso, com direito a um julgamento justo e pagar todas as atrocidades que fez a milhares de pessoas, acaba por cegar algumas pessoas.
Se olharmos para o comunicado conjunto do Presidente da Comissão Europeia e do Presidente do Conselho Europeu e também para a certeza de Hillary Clinton vemos que o futuro está traçado: é «o início de uma nova era»! Está dito e mais que visto!
Na verdade é, de facto, o início dum novo período na história da Líbia mas, nem estes políticos, nem o povo da Líbia sabem o que os reserva. Não sabemos se a morte desta pessoa vai ser, como já anunciaram, o melhor para o futuro da Líbia e da sua população. Não sabemos se a morte desta pessoa vai contribuir para um caminho de "liberdade" e "mais democrático". Não sabemos, e pronto!


Hillary Clinton disse em 2003, quando ainda disputava o lugar de senadora, que a captura de Saddam Hussein poderia contribuir para a estabilidade e para a paz no Iraque. O homem foi enforcado (nova barbárie, mas legalizada!!) e o Iraque continua em pé de Guerra.
Ossama Bin Laden foi morto, e o Afeganistão continua em guerra.
Mubarak foi preso, está a ser julgado, e o Egipto continua a ferro e fogo.
A Tunísia deitou a baixo Ben Ali, outro ditador, e ainda não se conseguiu endireitar apesar de ter já as eleições marcadas - existem ainda focos de conflito social.


Mas será que a história ainda não nos ensinou nada? Ou talvez sejam optimistas quanto ao futuro, acreditando na ideia de Robert Bailey: «a sociedade é composta por indivíduos que, sendo racionais ou capazes de se tornarem racionais, hão-de impulsionar a humanidade para novos níveis de civilização.».
A questão é que quando há um sentimento optimista podemos ser sempre confrontados com a visão pessimista da mesma situação: «a sociedade é composta de massa que, sendo não racionais e facilmente influenciáveis hão-de reduzir a humanidade à mediocridade.»


Quanto ao futuro, só o tempo o dirá...




ADENDA (23.10.2011) - A recusa, ainda que não se conheçam os fundamentos, do Conselho Nacional de Transição em realizar uma autópsia ao corpo de Gaddafi, ainda para mais quando já foram divulgados vídeos que o mostram vivo e capturado contrariando a "versão oficial", não augura nada de bom para a Líbia que se segue...

20/10/2011

A estupidez devia pagar imposto

Se a estupidez pagasse imposto talvez os nossos sacrifícios não tivessem que ser tão grandes. E este iluminado estaria num dos escalões de contribuição mais elevados: José Manuel Fernandes!



Diz JMF: «Eu fechava amanhã a RTP Informação»

Pois se fosse eu, mandava erradicar amanhã todos os estúpidos da crosta terrestre... Mas José Manuel Fernandes está com sorte porque eu não tenho esse poder!

É preciso que se saiba que fechar qualquer serviço público de televisão ou rádio é entregar nas mãos de privados e grupos económicos, neste caso ligados à informação, o controlo sobre aquilo que nos entra pela casa a dentro.
Basta que olhemos o que se passa, esse triste cenário, com os canais generalistas. A RTP tornou-se, nesta fase, o refúgio daqueles que não se querem evangelizar com a ignorância e o espectáculo degradante em que se tornaram os canais generalistas privados (tanto na área noticiosa como na do entretenimento), em particular, com os seus "reality show's" - mas há mais exemplos nas grelhas de programação.

O desaparecimento dum canal de informação público, ainda que com manifestos problemas no funcionamento (que seguramente podem ser melhorados), é autorizar de forma implícita que através dos grupos de  interesses meramente económicos a informação nos entre pela casa a dentro já digerida e em forma de opinião.
Será um benefício para quem prefere usar e defender ideias já processadas por cabeças terceiras, muito mais fácil, portanto, mas uma séria dor de cabeça para quem gosta de diversificar as fontes de informação para formular as suas próprias conclusões.

Já agora, e não se aplicando em concreto ao canal público de informação, por falar em privatizações, é importante não esquecer o nº 5 do art.º 38 da CPRP quanto à necessidade de um serviço público de rádio e TV para assegurar a «Liberdade de imprensa e comunicação social»:
«O Estado assegura a existência e o funcionamento de um serviço público de rádio e de televisão.»

Por isto e por muito mais, não sou defensor de qualquer privatização do serviço público de TV's ou rádios...

16/10/2011

Morte certa, ressurreição duvidosa

Não resisto a publicar aqui o texto de Miguel Sousa Tavares, alguém com quem eu nem sempre concordo, no Expresso de 15.10.2011 (pág 2):


«1 O discurso de Pedro Passos Coelho aos portugueses foi um texto bem escrito, bem elaborado, bem argumentado e lido com convicção e coragem - porque não era fácil. Essa é a grande qualidade de Passos Coelho: ele até pode estar errado em tudo, mas sente-se que acredita no que diz e está de boa fé.


2 O que ele agora nos veio dizer foi isto: "morram primeiro, que eu ressuscito-vos depois". E nós nada mais podemos fazer do que esperar que, contra toda a lógica, ele possa ter razão, no fim de tudo. Porque não temos alternativa (ou temos, e chama-se António José Seguro, o que vem a dar ao mesmo ou pior). A aposta é que, matando a economia, se restauram as finanças públicas. A Bélgica, a França, a Itália, a Inglaterra, os Estados Unidos, todos eles têm um problema de défice e de dívida soberana igual ou pior do que o nosso. Não é só Portugal ou os PIGS. A diferença é que eles têm a capacidade de retomar o crescimento e, por essa via, resolver o défice, e nós não. Subindo sem parar os impostos a todos os que ainda produzem, massacrando o consumo interno, o Governo está a matar a economia para pagar o despesismo público. O que eu gostaria de ter ouvido, e não ouvi, era o PM declarar, por exemplo: "Acabou-se Guimarães-Capital da Cultura, acabou-se o Museu Berardo, acabou-se o Metropolitano do Porto, acabou-se a Moda Lisboa, acabaram-se os dinheiros públicos para a Fundações privadas, acabaram-se os avales do Estado às dívidas da Madeira" (nem uma palavra de Passos Coelho sobre isso).


3 Já basta e ofende a desculpa da herança do anterior Governo.
Primeiro, porque juraram que que não o fariam; segundo, porque só mostra que nada sabiam do estado do país e não estavam preparados para governar, mas apenas para ocupar o poder; terceiro, porque, que se tenha percebido, o tal buraco inesperado de 3000 milhões decorre, todo ele, da privatização do BPN, nas condições definidas por este Governo, e das dívidas escondidas do querido Jardim, criatura emérita do PSD. E resta este facto: desde que o actual Governo tomou posse, todos os indicadores económicos da conjuntura não fizeram senão agravar-se - todos, sem excepção.
E, depois de quatro ou cinco aumentos de impostos sucessivos, a receita fiscal do Estado decresce, em lugar de subir (e não nos venham dizer que a culpa é de Sócrates).


4 Anuladas todas as deduções fiscais nos dois últimos escalões do IRS e generalizando o aumento do IVA para o escalão máximo de 23% sobre a restauração e o pequeno comércio está aberta a porta para a fuga fiscal. Por mais bonito que seja o discurso e por mais séria que seja a convicção dos seus autores nenhuma redenção virá do massacre da economia leal e do estímulo à economia paralela.


5 Mas o mais extraordinário do anúncio das grande linhas do OE para 2012 foram as reacções do PCP e do BE. Disseram eles, ofendidos e exaltados, que estas "políticas de direita" são insustentáveis, um "roubo aos trabalhadores", o "caminho para o desastre", etc. e tal. Como? Peço perdão: não foram eles que votaram o derrube do governo PS, abrindo caminho a um governo de direita?
Esperavam o quê - uma solução mais suave que o saudoso PEC4, que tão entusiasticamente chumbaram?»


(o itálico é meu)

Este blog não morreu!

Este blog não morreu!... Está mais parado, mas não morreu!
Novos projectos (profissionais e académicos) têm ocupado muito do meu tempo o que me impede de continuar a escrever aqui.


Por continuar atento ao que se passa, ainda que o tempo não sobre, vou tentar tornar-me mais presente também aqui!...
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