28/09/2015

As sondagens valem o que valem... mas valem para quem?

Se os estudos de opinião podem ser usados para inúmeros assuntos, é inegável que é em períodos eleitorais que mais damos por eles. E há para todos os gostos.

Estando nós em período de eleições legislativas (aguardem porque a seguir virão a eleições presidenciais!) todas as semanas somos inundados de sondagens sobre intenções de voto. Se as semanais, duas ou três, não eram suficientes, então agora surgem-nos com uma novidade: sondagens diárias!
Porque não só podemos escolher o centro de sondagens pelo qual nutrimos maior simpatia, podemos também escolher o resultado que mais nos agrada. E se é esta diversidade de resultados entre estudos de opinião, alguns feitos no mesmo período sem qualquer acontecimento capaz de alterar a intenção de voto dos eleitores, que confunde (admitamos a possibilidade de tal acontecer) os cidadãos interessados, é a mesma diversidade que os descredibiliza, até àqueles tecnicamente bem feitos.

Se das estatísticas poderemos dizer que estas consistem na arte de massajar os números até eles nos dizerem o que nós queremos, o mesmo já não se deveria aplicar aos estudos de opinião dado que eles deveriam ser representativos (ou aproximar-se) da opinião dos inquiridos sobre um tema específico ou intenção destes agirem em determinada situação, extrapolando estes resultados para uma representatividade do universo pré-determinado.
Mas se o universo estudado é importante para a um estudo de opinião, então é decisivo e crítico a construção da amostra.

Mesmo sem querer entrar na análise sobre a estratificação da amostra (interessante ver alguns dados, especialmente aqueles relacionados com as faixas etárias!) ou na discussão sobre as vantagens e desvantagens na utilização de um "painel" para sondagens e barómetros, independentemente da sua frequência, decidi dispensar algum tempo a perceber a amostra da sondagem referida numa notícia da RTP de 23 de Setembro: «Coligação com vantagem de cinco pontos na sondagem diária da RTP».
Porque as fichas técnicas publicadas pelos órgãos de comunicação social são muito importantes para perceber as própria sondagens, um melhor entendimento sobre como se chegaram àqueles resultados, ou como os sustentam, só é possível com todos os dados disponíveis. Por essa razão recorri ao arquivo de documentos depositados na ERC.

Podemos ver neste caso específico que nos é dito que para o estudo foram efectuadas 891 entrevistas e que destas se calculou uma taxa de resposta de cerca de 70% (69,61%) o que, poderemos assumir, foram considerados 623 inquiridos.
Observando a restante informação, podemos constatar que destas 623 entrevistas, 10% dos inquiridos indicaram não votar (62) e 12% nem sequer sabe ainda se vai votar (75).
Ficando estes 137 inquiridos imediatamente fora das contas, restam apenas 486 inquiridos que dizem que vão votar (65%) ou que "em princípio" o farão (13%). Mas diz-nos ainda a ficha técnica que destes 486, 29% não sabem em quem votar (141) e 8% recusaram-se a dizer em quem vão votar (39).
Em suma, é-nos apresentada a notícia de uma intenção de voto sustentada numa amostra de apenas 306 inquiridos.

Sem querer julgar a boa vontade das entidades que compram estes estudos e a sua dificuldade em compreender o seu grau de sustentação, ou questionar o rigor científico das entidades que vendem estes estudos, as minhas duas dúvidas sobre estes estudos adensam-se cada vez mais:
1) afinal, a quem servem estes estudos de opinião? e
2) será que estes estudos pretendem ser eles o simples reflexo duma opinião ou transformar-se num instrumento de construção duma opinião?

... Afinal, as sondagens valem o que valem... mas valem para quem?

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