Sem recorrer à quantidade de trabalhos académicos que estão na prateleira, agora que voltamos a ouvir falar do número de deputados e a intenção de os reduzir, começo por dizer, é minha convicção, que a recorrência deste discurso demonstra o quão fácil é lançar soundbytes para atrair "boas graças".
Foram várias as vezes que ouvimos, particularmente em momentos de campanha eleitoral, alegar como grande medida na reforma do sistema eleitoral a redução do número de deputados na Assembleia da República como se os 230 deputados, máximo previsto na Constituição da República Portuguesa, fossem a razão de todos os males do nosso país e da nossa Democracia.
Não digo que da casa da Democracia não saia algum do mal (e também do bem, é justo que se diga) de que padecemos, mas o mal não está, certamente, no número de deputados.
Recentemente ouviram-se até propostas, sem qualquer fundamentação ou estudo, que o número de deputados poderia passar de 230 para 180 ou mesmo para 115!
Tantos foram os estudos sobre reformas do sistema eleitoral que nem vale a pena cita-los todos (desde a redução dos círculos eleitorais até à representação personalizada passando pelo sistema maioritário em vez de proporcional), mas poder-se-ia dividi-los naqueles que continuam a permitir uma maior representatividade dos partidos e noutros que reduzem essa representatividade favorecendo os partidos mais votados.
Mas de todos estes estudos, seja qual a posição de representatividade de ocupem, maior ou menor, nenhum deles é capaz de correlacionar a redução do número de deputados com a «maior proximidade entre eleitos e eleitores e uma menor dependência dos eleitos face às direções partidárias», como foi recentemente (05 de Outubro de 2012) anunciado pelo Secretário Geral do Partido Socialista, António José Seguro.
A intenção apresentada agora por António José Seguro para a apresentação de uma proposta de alteração para uma espécie de modelo de representação proporcional personalizada não é diferente. É por isso que me parece prematuro avançar qualquer soundbyte de que a proposta visará a redução do número de deputados. E se o fizer, isto é, se efectivamente a proposta permitir uma redução do número de deputados ela não deve ser entendida como uma melhoria e eficácia nos trabalhos parlamentares, legislativos e, muito menos, numa maior independência dos eleitos face às direcções partidárias. Com uma relação mais estreita com os eleitores, talvez, agora um maior distanciamento das direcções partidárias, dificilmente! Esse distanciamento resulta mais do funcionamento interno dos próprios partidos do que do número maior ou menor dos deputados.
Apenas como exemplo posso destacar um dos mais recentes estudos sobre esta matéria, curiosamente solicitado pelo Grupo Parlamentar do PS e elaborado pelos Professores André Freire e Manuel Meirinho, e Diogo Moreira: "Para uma melhoria da representação política, A reforma do sistema eleitoral" publicado pela Sextante Editora.
Porque o que se pretende no discurso político, muitas vezes, é a capturar a atenção para o tema através de frases marcantes e com pouca concretização, o que me parece que ficou subjacente ao discurso do Secretário Geral do PS não deverá diferir muito de algumas das ideias deixadas neste trabalho, onde facilmente se percebem as vantagens e desvantagens numa reforma neste sentido. Por isso, poderão constatar que nele, onde se prevê uma alteração aos actuais círculos eleitorais mas mantendo os níveis de proporcionalidade e governabilidade, a redução do número de deputados é da grandeza de... 1 (um). O sistema eleitoral português veria reduzido o número de deputados de 230 para 229!
Em conclusão, não existe qualquer estudo, que se conheça, que atribua ao número de deputados um impacto relevante no sistema eleitoral que justifique uma reforma eleitoral baseada apenas nessa convicção!
Antes de se perguntar sobre qual o número certo de deputados para compor a Assembleia da República é necessário que se saiba exactamente que sistema se pretende implementar.
Empiricamente poder-se-á dizer que, na maior parte das vezes, a critica feita aos deputados pelos cidadãos não passa tanto pela quantidade de deputados mas sim pela qualidade do trabalho por eles realizado. Este sim, um soundbyte a ter em conta.
ADENDA (06.10.2012)
Este texto faz ligação à notícia disponibilizada no site do PS que já não está disponível (pelo menos através do mesmo link). Por essa razão aqui a reproduzo na integra (imagem):
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