A recente alteração no cargo de Presidente (não confundir com Secretário-Geral) do Partido Socialista veio acrescentar uma maior assertividade na mensagem política socialista. Nem sempre concordando com as posições de Maria de Belém Roseira, reconheço-lhe um trabalho positivo mas discreto no exercício da presidência do PS. Já Carlos César, talvez pela sua vasta experiência política e governativa, adopta uma postura menos discreta e mais interventiva. Mas também nem sempre estou de acordo com aquilo que defende.
É esta a maravilha da democracia e liberdade política e de expressão que muitos, de há uns tempos para cá, parecem ter vindo a esquecer ou a menosprezar.
Carlos César afirmou recentemente que «se temos maus políticos é porque os portugueses querem, se temos más políticas é porque os portugueses querem, sobretudo os que não vão votar» e é aqui que entra um "Sim, mas..."!
As declarações de Carlos César, em certo sentido, são inegáveis mas só se as quisermos enquadrar no seu verdadeiro contexto e admitir uma inadvertida confusão entre a utilização do verbo "querer" e o "optar" ou "escolher".
Na verdade,os maus políticos - os de hoje, os de ontem e até mesmo os de amanhã - foram e serão eleitos pelos portugueses. E se a maioria dos eleitores portugueses elegeram os actuais políticos, os que nos conduziram às actuais políticas, isso deve-se não só à liberdade de escolha dos eleitores, mas também à interpretação e avaliação que fazem das mensagens políticas e do seu contacto com as consequências práticas e reais dessas políticas.
Não vale a pena entrar em grandes considerações e análises de dados sobre aquele que tem sido o envolvimento dos eleitores na vida política da terceira república(1) em Portugal, mas é do conhecimento geral - sustentado por inúmeros trabalhos e ensaios - o aumento progressivo do distanciamento entre governados e governantes. No entanto, se é correcto dizer-se que o abstencionismo cria todas as condições para uma escolha feita apenas por alguns com impacto em todos, já não é verdade que seja o abstencionismo responsável por querer melhores ou piores políticos, por querer melhores ou piores políticas. Não estamos perante uma dicotomia de responsabilidade ou vontade entre votantes e não votantes. Muito provavelmente estes últimos não querem nada e o que os primeiros querem é-lhes indiferente. Muito provavelmente estes últimos pura e simplesmente deixaram de acreditar e por isso entendem abdicar da sua escolha condicionada.
É que, na verdade, se tomarmos atenção àquilo que as pessoas dizem nos cafés, nas ruas, nas associações, nos transportes públicos, enfim, no país real, facilmente no apercebemos que os eleitores querem, de facto, melhores políticos e querem, de facto, melhores políticas. Mais do que querer, precisam de melhores políticas! Mas no momento em que poderiam levar por diante essa sua pretensão vêem-se confrontados com um acto de opção em listas de políticos, bons e maus, previamente seleccionados por aqueles que detém essa exclusividade: os partidos políticos.
Sempre fui um defensor da existência de partidos políticos - para mim é inconcebível a existência de Democracia sem estes - e advoguei (e continuo a advogar) a participação dos cidadãos na vida activa destas organizações. Mas está na altura dos partidos políticos perceberem que não temos maus políticos porque os portugueses querem. Se os temos, é porque foram as opções impostas aos portugueses através de listas elaboradas pelos próprios partidos. Está na altura dos partidos políticos assumirem que têm vindo a falhar naquele que deveria ser o seu papel na sociedade, que não conseguem passar uma verdadeira e clara mensagem de esperança, que não conseguem voltar a chamar a si o cidadão. Está na altura dos partidos políticos se reinventarem, de encontrarem novos caminhos e formas de responder às reais necessidades dos cidadãos.
Provavelmente, o primeiro passo para querer melhor terá mesmo que começar no interior dos partidos políticos - e neste ponto há que reconhecer alguns passos já dados nesse sentido tanto pelo Partido Socialista como pelo LIVRE/Tempo de Avançar.
(1) Sem entrar numa outra discussão, assumo a expressão mesmo reconhecendo a existência de uma divergência quanto a esta classificação dos últimos 41 anos da democracia portuguesa.