26/12/2014

O Álvaro sem Medo

Há uns dias comprei um livro chamado "Wit - ensaios humorísticos" de Robert Benchley e após ter lido 3 dos "ensaios" daquele conjunto fiquei, sinceramente, a duvidar da existência, na minha pessoa, de sentido de humor. Felizmente, uma oferta 'literária' neste Natal fez-me recuar nessa minha dúvida.
Numa livraria, passaria ao lado deste livro e não perderia um segundo sequer a ler a contracapa. Graças a esta oferta, percebo hoje o que estaria a perder: largos minutos de boa disposição.

Se há uns dias atrás me dissessem que estaria a ler o livro "Reformar sem medo - Um independente no Governo de Portugal" de Álvaro Santos Pereira eu não acredita e, provavelmente, desataria a rir. O que é um facto é que o estou mesmo a ler e admito que estou a gostar. Não pela assertividade que ele contém (nenhuma!) mas sim pelo optimismo e auto-elogio do autor.

Com o Capítulo 1 lido, a apresentação do autor e dos seu trabalho, o leitor fica com a clara ideia de que o livro se deveria chamar "As aventuras de Álvaro sem Medo - Um independente no Governo de Portugal"*.
Álvaro apresenta-se aqui como uma personagem, pela sua independência, em espírito de missão numa espécie de Zorro com tiques de Calimero. Sem a indumentária característica do justiceiro ou o seu cavalo Tornado (mas mostrou-se, na altura, disposto a reduzir o número e a cilindrada dos veículos do Ministério), Álvaro relata que lutou contra lobís e interesses instalados dentro do Ministério da Economia e do Estado e, por isso, foi alvo de represálias e destrato - e eis que o Zorro se confunde com o Calimero. Foi graças a ele, diz-nos 'Álvaro sem Medo', que "o maior Ministério desde o 25 de Abril de 1974" (faz questão de o lembrar, pelo menos, 3 vezes ao longo deste primeiro Capítulo) implementou as maiores "reformas estruturais" alguma vez vistas em Portugal (outra repetição constante ao longo destas páginas). Mas mesmo depois de ter deixado de ser Ministro, nestas páginas, Álvaro mantém a mesma coerência de quando exercia o cargo: enche o peito para reclamar a si a autoria e implementação de "reformas estruturais" sem que conseguisse ou consiga concretizar uma única que seja.

Neste Capítulo, onde apenas dá uma curta alfinetada no CDS e no seu líder, Paulo Portas, relativamente ao aumento da austeridade, Álvaro apenas concretiza "reformas estruturais" nas quais, diz, não ter responsabilidade, por falta de peso político: o aumento do IVA da restauração, a saída da AICEP do Ministério da Economia, "a enorme subida de impostos" ou a incapacidade de avançar com a redução do IRC em 2012. Mas quando arrisca entrar nas suas "reformas estruturais" eis que parece que estas se concretizam em revolucionar a "máquina burocrática do Estado" (pergunto-me se alguma vez terá ouvido falar de um programa chamado SIMPLEX ou mesmo no 'SIMPLEX II' que foi anunciado pelo seu ex-colega de Governo, Paulo Portas), acabar com as golden shares (veja-se o resultado que teve no caso da PT), ao inicio das privatizações (vejam-se as consequências nos casos da EDP, REN ou ANA, apenas como exemplos), a aposta "no sector mineiro em Portugal" (para onde se propagaram e multiplicaram as minas em Portugal, exportação mineira ou mesmo o aumento de empregos neste sector??) ou, veja-se o que se descobre pela caneta de Álvaro, o "relançar o sistema dual e de aprendizagem". Parece assim ficar evidente que, para além de uma propulsão destruidora das empresas que traziam para o Estado rendimentos e de uma visão muito redutora do conceito e definição de 'estrutural', pelo próprio, ficamos a saber que é 'Álvaro sem Medo"  o mentor de algumas das políticas de Crato "o implodidor".

Há, no entanto, um ponto neste Capítulo onde concordo integralmente com Álvaro: a competência para o exercício de qualquer cargo ou função não se obtém através de títulos académicos!

Uma coisa é certa: esta leitura, definitivamente, promete!




* - uma clara alusão à obra "As aventuras João sem Medo" de José Gomes Ferreira

04/12/2014

São Bento às cambalhotas

Fonte: Google Maps
Este poderia ser mais um texto sobre política. Não o é... bem, na verdade, e bem vistas as coisas, acaba por ser! A chamada "politica local".
Poderia ser sobre as cambalhotas que se dão em "São Bento", nome alternativo quando se alude à Assembleia da República, ou às decisões que dela saem e que fazem com que nós, cidadãos (ou "cidadões" segundo o Presidente da República), andemos às cambalhotas. Mas não. É mesmo sobre a Rua de São Bento em Lisboa.

Rua de São Bento onde se torna difícil compreender a gestão urbana, rodoviária e de segurança e, por vezes, até mesmo diferenciar os animais racionais dos irracionais. Poder-se-ia pensar que a Rua de São Bento é uma rua nobre por, quase no seu fim (e a olharmos vista a partir do Largo do Rato), comporta um importante imóvel patrimonial nacional que assume a honrosa função de ser a "Casa da Democracia" e, talvez por isso, ser percorrida por largas dezenas (ou centenas) de turistas nacionais e estrangeiros diariamente, seja em autocarros panorâmicos, seja em táxis, nos "tuk-tuks" e similares, ou mesmo a pé. Quem conhece esta importante rua conhecerá, seguramente, este facto.
Um pormenor muito importante a reter nesta fase do texto é que, adjacente à parte nova da casa da Democracia existe um pequena esquadra de polícia... muito discreta, mas está lá.

Pois comecemos pela perspectiva do condutor. Atente-se que falamos de uma Rua e não de uma Avenida. Se só esta referência não chegasse, poderíamos dizer que esta é uma rua estreita para o actual volume de circulação rodoviária. Em certas zonas do troço, dois autocarros cruzam-se com imensa dificuldade... algumas vezes, um deles, por segurança (de quem?), acaba mesmo por ter que galgar o passeio. Mas se noutros troços da rua esta situação poderia ser evitada pelo simples facto da estrada alargar, tal não se verifica por causa de veículos (mal) estacionados na estrada, em zonas proibidas, em cima de passeios, passadeiras e, também já os vi, em segunda fila!... e onde o problema ocorre com maior incidência?... ironia do destino: em frente à dita esquadra de polícia!

Mas se da perspectiva de um condutor descer ou subir a Rua de São Bento não é uma tarefa fácil, na condição de peão a coisa não melhora. Ignoremos os carros estacionados em cima dos passeios que antes referi, nas paragens dos autocarros e mesmo em cima das passadeiras. Se são um problema para o peão comum, imaginem os obstáculos que constituem para pessoas com mobilidade reduzida ou dificultada (apenas como referência, este "espectáculo" tem continuação na Av. D. Carlos I, onde se situa a ACAPO!).
Caminhar nos passeios da Rua de São Bento são uma autêntica aventura. Isto é, o peão é obrigado a uma gincana para se desviar dos buracos na calçada, dos andaimes e taipais de obras (alguns de anos!) e de 'presentes' fecais deixados pelos animais (desta vez refiro-me aos cães... não aos outros animais que os deixam defecar no meio do passeio e optam por lá deixar ficar o resultado da necessidade fisiológica). Sobre estes últimos 'obstáculos' poderíamos julgar que, por razões óbvias, se concentrariam nas imediações do "Hospital Veterinário" da zona, mas infelizmente não. Estão espalhados por toda a rua. De cima a baixo! Mas se a situação já obriga a este ziguezague nos passeios, por si só já bastante estreitos, acrescente-se a tudo isto um comboio de caixotes do lixo ao longo da rua, daqueles que as pessoas guardam nas escadas!

Mas a obras constantes nos edifícios, se são boas para fazer mexer a economia, tornam-se um problema para os transeuntes, principalmente quando se prolongam demasiado no tempo. Muito perto de uma hospedaria que existe nesta rua, perto do Largo do Rato, a recuperação de um edifício que está a ser levada a cabo, depois de muito tempo com fitas de plástico vermelhas e brancas a vedar parte do passeio, ocupa agora todo o passeio e obriga, através de duas passadeiras provisórias (amarelas) o peão a atravessar a estrada para o outro lado. Até aqui, tudo bem! O problema é que o sinal vertical de indicação de passadeira, em ambas, só existe para os condutores que descem a rua. Os que seguem no sentido ascendente, não têm sinal vertical e, muitos vezes, ignoram as passadeiras (mal) pintadas. Mais em baixo, junto a um taipal com alguns anos e que apenas delimita a zona de uma estrutura de ferro que segura um edifício - taipal esse que não só ocupa o passeio como parte da estrada - também existem duas passadeiras. A primeira, no sentido de quem desce a rua, devidamente sinalizada em ambos os sentidos e de carácter definitivo (branca). A segunda, mais a baixo, apesar de um sinal vertical no sentido descendente (no sentido ascendente esse sinal não existe, como nas outras)... não existe!... O sinal está lá, a passadeira não! - Será a ausência de sinais num dos sentidos sinal dos tempos ("cortes na despesa") ou que os manda colocar ignora que a rua tem dois sentidos?

... E assim, lá se vai por São Bento às cambalhotas.

Infelizmente, este não é um 'retrato' exclusivo da Rua de São Bento. Este é o retrato da crescente falta de civismo, da falta de educação e, acima de tudo, da falta de respeito pelo outro. Seja na "utilização", seja na "gestão". Quando poderíamos julgar que a sociedade em que vivemos já se encontraria num estádio avançado de evolução, estas pequenas grandes coisas fazem-nos pôr os pés na terra e perceber que, afinal, o ser humano ainda está numa fase muito primária da sua inteligência!
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