Fonte da figura: http://wheelockglobalcauses.org/education/globalization-in-developing-nations/ |
Ao que parece, no dia em se soube que o "risco de pobreza aumentou em Portugal para o valor mais elevado desde 2005", o mesmo dia em que, sobre salários milionários num novo banco público, o Prof Eduardo Catroga acha que está tudo bem "desde que sejam valores de acordo com os objectivos atingidos" e a Prof Teodora Cardoso insiste que os "salários de trabalhadores com poucas qualificações não podem subir muito" (curioso que o mesmo acontece e acontecerá para os trabalhadores com elevadas qualificações - os que ficam, não os que saem), o tema da "globalização" voltou a ter algum destaque como há uns anos atrás... a mesma "globalização" que serve para sustentar a "saída da zona de conforto" (aqui, aqui, e aqui) e que "a exposição de quadros portugueses qualificados no Mundo inteiro é uma mais-valia para Portugal".
Mas para melhor se perceber a diferença entre esta "globalização" e a verdadeira Globalização, não resisto a transcrever parte de um texto de Pierre Bourdieu... de 1996!
«Evoquei a "globalização": esta é um mito no sentido forte do termo, um discurso poderoso, uma "ideia-força", uma ideia que tem a carga social, que obtém crença. É a arma principal das lutas contra as garantias adquiridas do welfare state: os trabalhadores europeus, diz-se, devem rivalizar com os trabalhadores menos favorecidos do resto do mundo. São apontados assim como modelos aos trabalhadores europeus países em que o salário mínimo não existe, em que os operários trabalham 12 horas por dia em troca de um salário que varia entre 1/4 e 1/15 do salário europeu, em que não há sindicatos, em que se recorre ao trabalho infantil, etc. E é em nome de um modelo semelhante que se impõe a flexibilidade, outra palavra-chave do neoliberalismo, quer dizer o trabalho nocturno, o trabalho ao fim-de-semana, as horas de trabalho irregulares, outras tantas coisas inscritas desde toda a eternidade nos sonhos patronais. De uma maneira geral, o neoliberalismo opera o regresso sob as aparências de uma mensagem muito elegante e muito moderna às mais velhas ideias do mais velho patronato.[...]Insistindo na ameaça extra-europeia, esconde-se que o principal perigo é constituído pela concorrência interna dos países europeus e por aquilo a que por vezes se chama o social dumping: os países europeus com fraca protecção social, com salários baixos, podem tirar partido das suas vantagens na competição, mas arrastando para baixo os outros países, obrigados, a abandonarem as garantias sociais adquiridas, para resistirem. O que implica que, para escaparem a esta espiral, os trabalhadores dos países avançados têm interesse em associar-se aos trabalhadores dos países menos avançados, a fim de conservarem os seus direitos adquiridos e de favorecerem a sua generalização a todos os trabalhadores europeus.»
É curioso ver que, quase 20 anos depois, este é um texto com uma actualidade gritante.